Infelizmente ainda são comuns alguns preconceitos arcaicos (visão de psicoterapia do século retrasado!) acerca do é psicologia, psicoterapia? Quem deve fazer? Por que deve fazer? Entre outros…
É uma pena que ainda existam os tabus do tipo: “terapia é para loucos”; “se tenho amigos para conversar, porque vou pagar para alguém me ouvir”, entre outras pérolas que escuto por aí.
Sempre que tenho oportunidade, gosto de conversar a esse respeito. É claro que com pessoas que mostram interesse. Gosto de ajudá-las a perceber seu ângulo de visão restrito acerca do que é psicoterapia e, assim ampliar sua visão, enxergando o tema de uma maneira mais abrangente e principalmente mais saudável. Aliás, aproveitando o ensejo, ampliar o estreitamento de visão de vida é uma das principais funções da psicoterapia. Sem querer, a pessoa que se abre para enxergar o tema de uma maneira diferente, vivencia um pouco do que é o processo psicoterapêutico.
Psicoterapia não é apenas para quem está psiquicamente doente, com depressão grave, alucinando, pensando em suicídio, à beira de um colapso nervoso, com uma doença orgânica grave, em processo de separação, em luto, dentre muitas outras razões tão intensas e graves como essas.
Em minha experiência clínica, tenho notado que tais questões, vamos dizer, emergenciais, acabam sendo um estopim. Se apresentam como uma finalidade maior: levar a pessoa ao processo de autoconhecimento.
Em psicologia analítica entendemos que em qualquer sintoma, seja físico ou emocional, há uma finalidade. Nesse sentido, o sintoma, qualquer que seja, é visto de maneira prospectiva: aponta para algo maior, um caminho a ser explorado e conhecido. Ele está a serviço de algo maior que é a conexão com o aspecto desconhecido que existe dentro de nós.
Peço desculpas pela minha expressão coloquial, mas tem aquele ditado que diz ”a água precisa bater na bunda para que alguma coisa seja feita”. Muitas pessoas, só procuram a psicoterapia quando estão no seu limite, quando a água bateu e percebem “e agora”. A água pode ser qualquer uma das possibilidades que apresentei anteriormente.
É quase um presente quando recebo pacientes em meu consultório que dizem não ter nenhuma questão emergencial. O objetivo de estarem ali é para se conhecerem. É lindo observar a escolha corajosa de tanto se deparar com a autopercepção e reconhecimento de pontos fortes, talvez ainda despercebidos, assim como de pontos fracos.
Conforme mencionei na reflexão sobre “Resiliência”, dentre outras características, uma pessoa resiliente é aquela que, por escolha, olha, reconhece, acolhe e desenvolve seus pontos francos. Afinal, em bifurcações futuras, a percepção dos aspectos desfavoráveis da personalidade, pode fazer toda a diferença.
E, a psicoterapia, além de acolher e amparar questões emergenciais está a serviço disso! Explorar aspectos desconhecidos da nossa personalidade que interferem negativamente nas nossas relações interpessoais, em nosso trabalho, enfim.
Diferente de um amigo que ouve nossas aflições, que dá conselhos pessoais sobre o problema, o psicólogo ouve e acolhe, para compreender junto com o paciente o que está acontecendo. O processo terapêutico, acontece pelo vínculo que se estabelece. Na relação estabelecida, não há manifestação de opiniões pessoas, pois isso instiga possíveis sensações de julgamento pelo paciente. O objetivo é entender a serviço do quê aquele problema está.
Lembremos da visão prospectiva que apresentei: em qualquer sintoma, questão, há uma finalidade intrínseca: um caminho sendo apontando e um convite para ser conhecido. E, um profissional capacitado, junto com você auxilia na identificação dessas pistas! Muitas vezes o fato de você reconhecer que tem 1 hora por semana ouvidos atentos e acolhedores para te ouvir, desencadeia um processo belíssimo: você mesmo se ouve! Você sai dos seus pensamentos e verbaliza suas emoções. Colocando-as para fora, se arejam e quando entram novamente em você, através dos seus ouvidos, a perspectiva muda!
Portanto, cabe destacar que psicólogos e amigos não são rivais, pelo contrário são aliados no processo de autoconhecimento. E, que, não é apenas em momentos tensos e difíceis que a psicoterapia é boa pedida. Sempre é, desde que esteja disposto a deparar-se com aspectos belos e sombrios de si mesmo.
Espero ter ajudado na desconstrução desses tabus. Aos interessados no assunto, que ficaram com “gostinho de quero mais”, indico a leitura do livro “Os desafios da psicoterapia”. Um livro sensacional, acessível ao público leigo e que dá uma noção bastante realista do processo terapêutico.